Carta Aberta

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Premência da otimização da anemia em doentes sujeitos a cirurgia eletiva

Com a situação pandémica gradualmente a melhorar em Portugal, e quando se começa a preparar a recuperação da atividade assistencial não realizada e fortemente impactada pela pandemia de COVID-19, consideramos essencial a correta otimização da anemia e da deficiência de ferro no doente candidato a cirurgia eletiva, resultando não só na eficaz gestão de recursos como também na melhoria do desempenho das unidades hospitalares e da qualidade do tratamento prestado aos doentes

De acordo com dados do Ministério da Saúde, nos hospitais, a atividade assistencial em 2020, comparada com 2019, registou uma enorme diminuição nas principais linhas de atividade. Em 2020 houve menos 1,2 milhões de consultas e, concomitantemente, a quebra de atividade foi também extensível às cirurgias, com uma descida de 126 mil cirurgias face a um volume de 704 mil cirurgias em 2019.

Estamos, portanto, num momento adequado para definir e implementar estratégias que visem uma retoma efetiva da atividade assistencial.

Entre estas estratégias, existe uma simples e fácil de implementar: a otimização da anemia e da deficiência de ferro, tanto em contexto pré-operatório como pós-operatório, o que impactará positivamente a gestão das reservas de sangue, a duração do internamento, a taxa de reinternamento e outros indicadores de qualidade assistencial:

  • Ao garantir um eficiente consumo de sangue, haverá uma melhor gestão das reservas disponíveis, o que permitirá o agendamento atempado das intervenções cirúrgicas necessárias.
  • Em contexto pré-operatório, a atempada otimização do doente anémico terá impacto positivo nos desfechos clínicos associados da cirurgia, traduzindo-se em menor número de complicações, menor necessidade de transfusões, menor morbilidade e, consequentemente, menor mortalidade.
  • Resultará também na redução do tempo de internamento pós-cirúrgico e na redução da taxa de readmissões, permitindo uma permanência mais curta em contexto hospitalar por parte do doente e uma maior disponibilidade de camas de internamento que, também, permitirá uma recuperação mais eficaz da atividade cirúrgica. É igualmente importante que esta otimização da anemia e da deficiência de ferro seja também avaliada e efetuada em contexto pós-operatório.

A identificação e tratamento da anemia em contexto cirúrgico é parte integrante e essencial do programa de gestão do sangue do doente (PBM – Patient Blood Management), amplamente conhecido, discutido e afirmado pela Organização Mundial da Saúde e pela Comissão Europeia, e cujo programa, em Portugal, está explanado na Norma de Orientação Clínica 011/2018, desenvolvido pela Direção Geral de Saúde. Com esta gestão é expectável diminuir em 51,2% as transfusões, em mais de 10% os internamentos e 37,2% os reinternamentos, apresentando também uma redução de custos (mortalidade, internamento, consultas, etc.) de 6,3% (o que perfaz uma poupança de um valor estimado em cerca de 67,7 milhões de euros).

A pandemia mostrou claramente as vulnerabilidades do nosso sistema de saúde. Não obstante, mostrou-nos que ainda há tempo para refletir sobre normas de orientação clínica e procurar oportunidades para melhorar os resultados em termos de saúde.

Sabemos que esta recuperação da atividade cirúrgica será gradual. Mas também sabemos que é possível atuar no imediato.

Cabe assim a todos nós unir esforços e valorizar a atempada e apropriada identificação e tratamento da anemia e da deficiência de ferro.

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